A realidade fiscal da maior parte dos entes federados do país passa por uma de suas mais delicadas fases, desde que se instaurou a necessária Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), elemento fundamental para o controle da inflação, para o ajuste das finanças públicas no início dos anos 2000 e, sem dúvida, argumento preponderante para embasar o alcance do tão necessário “grau de investimento”, que possibilitou ao país ser encarado com mais seriedade e confiança pelos investidores em capital de risco e de empréstimos externos.
Os compromissos emanados da LRF para os mais de 180 entes federados (estados e municípios) que estavam com suas fiscais contas colapsadas, ainda estão para chegar ao meio do caminho: afinal, as dívidas de estados e município, suas empresas e bancos, foram renegociadas e assumidas em sua totalidade junto ao governo federal, para serem resgatadas até o ano de 2030.
Seus encargos, no entanto, num cenário fiscal deteriorado pelas contingências da conjuntura recente e pelo efeito de medidas transitórias (que se tornaram permanentes), adotadas para sua mitigação (as desonerações de impostos), ajudam a compor um quadro hostil não só para a execução do orçamento corrente como para a expansão de investimentos nas áreas onde a demanda reprimida por serviços públicos está longe de ser atendida de modo adequado na maioria das cidades e estados brasileiros.
Em um contexto de carga tributária elevadíssima, gastos correntes exagerados e em muitos casos já ultrapassando os limites prudenciais das contingências demandadas pelo cumprimento da LRF, pior do que os efeitos naturais (conjunturais) ou criados pelos administradores públicos (as desonerações), só mesmo os efeitos que já estão sendo sentidos pelas medidas de ajuste e correção convencionais, como o aumento real de juros e redução ou o comprometimento dos gastos de investimentos.
Afora isso, os gestores de estados e municípios (notadamente dos municípios, que mal acabaram de tomar posse), ainda terão que assumir novos encargos de gestão “esperados” – como a assunção da iluminação pública e a adequação aos impositivos legais da lei de resíduos sólidos em 2014 –, afora outros obstáculos “não esperados” como as demandas sociais para a queda de tarifas e preços públicos como na área de mobilidade urbana ou por maiores investimentos em áreas como saúde e educação básica (creches). Ou, ainda, por imposições “surpreendentes”, ainda que empurradas para baixo do tapete orçamentário há anos, como o resgate de precatórios, com o comprometimento de até 3,5% da Receita Corrente Líquida (RCL) como se está gestando na área federal.
O pior, é que – ao contrário dos anos (e anos) anteriores –, parece não haver mais chance de se dar mais uma “postergadinha” (...) em prazos e salamaleques, uma vez que tanto os novos encargos “esperados” assim como os “não esperados” e os “surpreendentes” já passaram por inúmeras “chicanas” anteriores (opa!), audiências públicas e outras formas derivadas da principal ferramenta da gestão (sic) pública que é a da “embarrigada cívica”. Ou seja, uma embromaçãozinha temporal a mais... como a que acabou levando à LRF e as seus desdobramentos tão decantados.
Ora, imagine-se então ter que pensar em executar orçamentos, pagar despesas, dívidas e tantas outras obrigações em um primeiro ano de PPA herdado do administrador público anterior no seu primeiro ano de governo – com esse conjunto de surpresas sequer discutidas ou levadas em conta no período eleitoral por candidatos e muito menos por eleitores – e ainda tendo esse mundaréu de vozes nas ruas pressionando a se querer que se invista e se atendam as demandas públicas a valor presente! Ou seja, à vista e a cores.
Para estas situações emergenciais, não há padrinho ou madrinha que dê jeito!
É preciso inovar: e buscar soluções para superar os problemas; e não para jogá-los debaixo do tapete orçamentário (simplesmente porque não há mais margem para isso); ou buscar mais tempo (eis que o tempo já se foi).
Por exemplo, se os devedores de precatórios tiverem que comprometer 3,5% da RCL para pagar apenas (apenas...) os precatórios atrasados, estarão “comendo” 70% dos 5% da RCL que podem comprometer com contraprestações de PPP: se os entes federados não possuírem empresas para descarregar e realizarem os investimentos e assim não comprometer os limites estabelecidos para as PPP, então é preciso utilizar a figura das SPE dos Fundos de Investimento, que são empresas de capital aberto ou fechado, para realizar os investimentos sem comprometer as margens da RCL, de base orçamentária.
Sempre é oportuno lembrar, que – ao contrário do que se propala –, Fundos e SPE dos Fundos são duas coisas completamente diferentes: ao captar dinheiro para formar um Fundo de Infraestrutura, pode-se prever (previamente) no Regulamento do Fundo, recursos livres para formar garantias em papéis mobiliários para que a SPE que fará a gestão os fundos possa ela mesma (a SPE) dar em garantia em papéis comprados para esta finalidade, sem que os dotadores do Fundo – acionistas da SPE – estejam comprometendo o patrimônio de seus cotista primários em garantias a serem dadas nos certames de que suas SPE participem.
Isto é elementar societariamente e, por óbvio, em ermos de governança.
Da mesma forma como os Fundos podem prever “ex ante” recursos para pré-investimentos, para a realização de PMI por exemplo. Ou que irão destinar parcelas da captação para contra garantir operações de colocação de debêntures via a SPE criada para gerir o Fundo, ou para tomar parcela de recursos via empréstimos financeiros via a SPE, para alavancar ganhos financeiros e maximizar a TIR alavancada das operações.
Esses “SPE de Fundos” podem estar previstas nas licitações de PPP (ou de Concessões Plenas): ao final do prazo de maturação, os ativos formados (as cotas da Fundos) revertem ao Poder concedente e, como tal, os ativos que lastreiam os Fundos.
A SPE pode ser extinta ao final do mesmo prazo, para evitar a assunção da estrutura executiva da operação: uma nova licitação, ou a sua prorrogação, pode envolver, por exemplo, a assunção da estrutura existente formada pela SPE.
Isto vale para ativos que possam ser formados com base tarifária – como nas concessões plenas ou nas PPP Patrocinadas – e vale também para alavancar projetos de PPP na modalidade de concessão patrocinada, onde as atividades não são passíveis de tarifação.
No caso de saúde e educação – e de outras atividades como defesa e criação de vagas prisionais, por exemplo – o Poder Concedente, pelo prazo da concessão ou concessão via PPP, transfere ao parceiro privado, a governança da Autarquia Pública, apartada da estrutura de administração de governo, criada especificamente para este fim (uma “SPE pública”), para servir de veículo para receber as contraprestações do poder público pelo prazo das concessões e das concessões sob o regime de PPP.
E que, portanto, terão o mesmo tratamento fiscal dos pagamentos a Autarquias, Fundações Públicas ou as OSS e OSCIPS privadas, mas de interesse público, ou outras fontes assemelhadas já consagradas pela gestão pública, não utilizando ou impactando os 5% da RCL previstas na Lei das PPP.
Outro ponto considerar é o formidável estoque de ativos imobiliários que alguns entes federados dispõem. E que muitas vezes está ocioso, sem uso e sem rentabilização, e que poderia ser ou aportada ao capital das empresas que devem dar lastro aos fundos garantidores das PPP ou ser objeto de políticas públicas de uso dos mesmos para fins sociais na criação (ou troca) de ativos para fins de saúde, educação, oferta de vagas prisionais e daí por diante.
Assim como os formidáveis estoques de dívida ativa (créditos por impostos vencidos ajuizados).
Pasme-se que em alguns entes federados, o pior que poderia acontecer é existir um gestor púbico que perdoasse tais dívidas: de fato, em alguns casos já documentados, as provisões para perdas nos balanços de bancos, empresa privadas do país e do exterior já é em muito superior ao valor do patrimônio liquido dos devedores do erário.
Assim, um “perdão de dívida”, teria o condão de gerar a reversão da provisão, criando lucros para empresas e seus acionistas, forçando a distribuição e a sua tributação: em muitos casos, isto criaria a necessidade de chamadas de capital, pois não haveria caixa suficiente para aceitar tal perdão.
Ora, por que não se certificar a dívida ativa, separando o que é real e o que é irreal, oferecendo-a em pagamento para quitar pendências entre esferas do poder público (na LRF, por exemplo) e/ou como lastro para que a até agora invisível ABFG criada em 2012 com R$ 11 bi de capitais, para lastrear concessões e fundos garantidores, possa prover estados e municípios de um elemento fundamental para a operacionalização de PPP?
E o que dizer de “direitos emergentes do mobiliário urbano”, em cidades onde existe a lei da cidade limpa? E onde a mídia indoor cresce a taxas de 30% ao ano e tem nos espaços regulamentados pelo poder público um elo inextricável da política de “cross mídia”, fundamental para a mídia out of home, que desonera e da eficácia à política de “mass mídia” dos grandes anunciantes, premidos pelo alto custo da mídia tradicional, da TV?
Enfim, decifrar o enigma antes que a Esfinge devore a quem apenas a admira e contempla!
(Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do PPP Brasil. O portal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações).