Um processo inflacionário é o pior inimigo de uma visão de longo prazo. O Brasil viveu um prolongado período imerso em preocupações de curtíssimo prazo, tendo como consequência um grande esvaziamento das instituições e organizações da administração públicas dedicadas ao planejamento e implantação de projetos de infraestrutura.
Com a estabilização econômica que se seguiu a implantação do Plano Real e a consolidação de um novo regime fiscal, este consagrado na Lei de Responsabilidade Fiscal, o país teve a oportunidade de aperfeiçoar, ainda que muito lentamente, um conjunto de instrumentos institucionais necessários à viabilização de investimentos em infraestrutura para que o Brasil possa alcançar os padrões competitivos exigidos pela concorrência internacional.
Em parte, a revitalização dos setores de infraestrutura foi obtida por meio do processo de concessões ao setor privado dos serviços de transporte rodoviário, ferroviário e de arrendamentos de terminais portuários (devendo ser incluídos também aqui os resultados alcançados com as privatizações em telefonia e eletricidade). A privatização permitiu o criar uma nova classe de empresas, comprometidas com a operação, manutenção e ampliação da infraestrutura pública, com horizontes contratuais de longo prazo (de 20 a 30 anos).
Porém essa nova indústria, que difere das organizações tradicionais focadas em engenharia e construção, não substitui o estado em suas funções de público, isto é, de planejamento e priorização de novos projetos. Mesmo assim essas concessionárias trouxeram uma contribuição efetiva. Além de recuperar, manter e ampliar os serviços, as concessionárias constituíram-se num novo tipo de agente social que demanda oportunidades de expansão de seu negócio em novas concessões. Assim, ao agregar uma visão de longo prazo, contrastante a mera busca por novas obras, as concessionárias contribuem de forma ativa para desenvolvimento da infraestrutura do país.
Nesse sentido, cabe ao poder público buscar os meios mais eficientes e transparentes de seleção e priorização de projetos, bem como, escolher entre as alternativas de contração que valorizem as parcerias de longo prazo.
Uma breve retrospectiva dos últimos vinte anos indica alterações nas leis de contratação pública, a implantação de marcos regulatórios setoriais, a criação das agências reguladoras e o crescente papel sinalizador dos Planos Plurianuais como instrumentos de planejamento e de busca por parcerias de longo prazo.
No que diz respeito aos Planos Plurianuais, criados pela Constituição de 1988, cujo início se deu formalmente na proposta de 1992-95, mas sem qualquer ímpeto diante do processo de impeachment do Presidente Collor. Ganho cores em segunda tentativa no PPA 1996-99, que trouxe como contribuição, no plano chamado de Brasil em Ação, o a combinação de conceitos de planejamento regional, planejamento estratégico de longo prazo, adotando os Eixos Estratégicos de Desenvolvimento e apresentando o primeiro portfólio de projetos articulados.
O PPA 2000-03, apelidado de Avança Brasil, constatou a grande dificuldade de implantar os projetos prioritários da carteira selecionada e adotou como estratégia de enfrentamento o gerenciamento intensivo e voltado a resultados. Criaram-se os gestores responsáveis pelo andamento de cada projeto e supervisores que fariam a articulação de projetos nos Eixos Estratégicos.
Esse processo de construção institucional sofreu um desvio com o PPA 2004-2007, o Plano Brasil adotou como instrumento de planejamento os temas políticos e as ações. O desvio de rota não tardou a ser corrigido, quando em 2007 se retoma a estrutura do Brasil em Ação por meio do lançamento do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), tendo a presidente Dilma, então como chefe da Casa Civil, a frente da coordenação geral do plano. Não é coincidência a presença de projetos do PPA 2000-03 no PAC 1. A sensibilidade política do presidente Lula acrescentou uma característica adicional o PAC, ao intensificar o diálogo regional na priorização das obras federais. A importância do interesse manifesto nos Estados explica o deslocamento do PAC do Ministério do Planejamento para a Casa Civil.
É importante mencionar que as atividades de planejamento setorial foram colocadas em segundo plano diante de processos de reestruturação dos setores, em parte por transferência de quadros para outras funções, em parte pelo crescimento do prestígio dados as agências reguladoras. Não há como atrair e manter profissionais de alta qualificação sem que se criem instituições igualmente qualificadas. Um exemplo dessa reação foi dado pelo Ministério das Minas e Energia com a criação da EPE - Empresa Brasileira de Planejamento Energético, prevista desde o início da reestruturação do setor elétrico, mas só criada após o racionamento.
No âmbito do setor dos transportes é necessário enfatizar a importância do Plano Nacional de Logística de Transporte, o PNLT, que nos termos do próprio ministério representou uma retomada do processo de planejamento no País, adota uma metodologia de avaliação de políticas públicas em transportes.
O Ministério dos Transportes tem estimulado que os Estados desenvolvam estudo de âmbito local e empregando a mesma metodologia de avaliação. Algumas experiências de planos logísticos estaduais, como é o caso dos estudos desenvolvidos pelos estados de Minas Gerais e Rio Grande do Sul, demonstram como é possível coordenar o planejamento estratégico de longo prazo com a implantação de projetos de forma coordenada, permitindo que as esferas federativas se articulem em benefício da população local.
Não se pode negar a existência de avanços institucionais, mas eles parecem ser insuficientes para fazer frente aos desafios do país. Na área de transportes se vê a retomada da inteligência no planejamento, mas ela necessita ser urgentemente ser estendida a todo o ciclo de vida da contratação de projetos. Somente com a revitalização de instituições dotadas de inteligência será possível retirar a proeminência que os órgãos de controle (CGU) e fiscalização (TCU) têm ganhado nos processos de contratação.
*Versão expandida de artigo publicado na Revista CNT - Transport Atual, Edição 203 de Julho de 2012, página 79.
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