No debate sobre a necessidade ou não de se promover um choque fiscal na economia brasileira, comparam-se dados sobre o endividamento líquido do país, em relação ao seu produto interno bruto.
Abstraindo-se o perfil da dívida – ou seja, seus prazos e custos médios – procura-se justificar a necessidade (ou não) de se gerar maior ou menor superávit primário das contas públicas nacionais, para retomar a confiança dos mercados: notadamente após duas (das três) principais agências internacionais de risco, terem feito flutuar as notas de avaliação do país.
Para o (e)leitor comum, como explicar que a dívida de todos (dívida pública) em relação à produção gerada por todos (o tal do PIB) pode gerar ou não um acréscimo de impostos ou uma redução dos investimentos que impeça (ou corte) o acesso aos serviços públicos essenciais e (por vias tortas) dificulte (ou vede) o acesso a bens e serviços outros de necessidades menos essenciais (mas não menos necessárias)?
Mas, “pera lá”: quem faz a dívida pública é o governo; e quem faz o PIB é o setor privado, ainda que os serviços e os bens públicos também sejam computados.
O correto não seria saber - primariamente - se o que o que o governo gera na execução de suas contas é suficiente para honrar o que se deve para todo o mundo (inclusive para o público interno, na forma da oferta de bens e serviços)?
Afinal, o PIB é do país (o tal do “meu, o seu e o nosso produtinho”; ou na dimensão financeira, “o meu, o seu e o nosso dinheirinho”).
Sob este prisma, o que se deveria levar em conta – antes do PIB – é que se a Receita Corrente Líquida (RCL) da União gera lastro para enfrentar estas encrencas (sic): e se, sob este conceito, o endividamento bruto e líquido (isto é descontadas o caixa e os haveres financeiros) sobre esta mesma RCL sustentaria, por exemplo, investimentos que parceiros privados poderiam se ver estimulados a fazer, nas modalidades de Concessões e PPP, para evitar uso de recursos da União.
Avaliar este “risco” é como avaliar os Editais e Contratos de Concessão que estados e municípios têm lançado ao mercado nos últimos anos, em quantidade muito grande e com um percentual de sucesso muito pequeno se considerado o número efetivo dos contratos efetivamente assinados sob os institutos das concessões: notadamente as modalidades de concessões administrativas e patrocinadas, que são admitidas nas operações de PPP.
E podem fornecer uma pista mais consistente do “porque” projetos de PPP têm deslanchado em velocidade muito menor do que se imaginava do que ocorreria após mais de 10 anos da promulgação da lei federal das PPP (em 2004).
Com efeito, (e tal como se faz na análise das contas públicas de estados e municípios nos seus chamamentos ou nas PMI que demandam do setor privado), a Receita Corrente Líquida (RCL) da União (dados fechados da STN, na RGF de 2013), é de R$ 626 bilhões: 1% da RCL poderiam ser comprometidas em operações de PPP (ou R$ 6,26 bilhões).
Pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) – a que a União também está sujeita -- as despesas brutas de pessoal da União são de 23% da RCL (algo como R$ 394 bi): o limite de alerta da LRF para tanto é de 34% (há folga aqui, pois).
Mas a relação Dívida Bruta/RCL da União é de 477% (todas as dívidas: internas e externas, precatórios, de créditos internos e externos): algo como R$ 3 ,1 trilhão para uma RCL de R$ 626 bilhões. Se descontadas o caixa, os haveres e outras disponibilidades, a relação passa para 170% da RCL.
Não há poupança fiscal líquida (como não há em muitos estados e municípios para sustentar contraprestações de PPP). Todos (União e entes federados) estão sofrendo com o menor PIB, que encurta o cobertor da arrecadação; os entes federados ainda têm que peitar os efeitos adicionais das desonerações de impostos (para alavancar consumo), assim como carregar dívidas da LRF. E olhe que (estranhamente ninguém lembra) os juros cobrados pela LRF previam (sic) um crescimento do PIB da ordem de 4% ao ano, para pagar o serviço destas dívidas rotundas!
Com um PIB de crescimento fracionado, como pagar estas dívidas?
Ou seja, a geração de poupança fiscal básica está, sim, muito prejudicada. E enseja, sim, muitas interrogações. Ou questões como: se não há poupança fiscal, as rotundas reservas externas cresceram turbinadas como? Se não havia “caixa primário” se colocou papéis de dívida para formar estas reservas, cevando mais dívidas. E ai a questão dos custos e do perfil de tempo, são, sim, muito relevantes.
A União tem a ABGF para ancorar dúvidas e dívidas: os entes federados estão fora desta ferramenta.
A questão fiscal, pois, não apenas é: na verdade, tem sido a questão de fundo mais importante da economia brasileira, e empurrada para baixo do tapete, nos últimos 15 anos.
Quem desatar este nó fará deslanchar a economia brasileira. Quem viver verá!
(Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do PPP Brasil. O portal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações).