No ano em que se irá comemorar 10 anos da promulgação da Lei 11.079, a Lei Federal das Parcerias Publico-Privadas, é oportuno sugerir um conjunto de medidas voltadas a permitir a melhor utilização desse instrumento.
Claro está que há alguns pressupostos a serem observados, sem os quais, estas ou quaisquer outras sugestões que caminhem na mesma direção, serão nada mais do que meros desejos.
O principal deles diz respeito à necessidade de se promover a um ajuste fiscal efetivo, do lado das despesas de custeio e de investimentos, por parte dos agentes públicos.
De fato, sem geração primária de caixa consistente, nenhum agente público concordará em assinar contratos sob o risco de se expor a processos de improbidade administrativa quando já estiver distante de suas responsabilidades funcionais.
Como fazer isso num contexto onde às desonerações fiscais, que comprometeram parcela significativa das transferências do FPE e do FPM, comprometeram as margens de investimento com recursos próprios por parte dos entes federados?
A alternativa foi a de se ampliar o endividamento: jogou-se para o serviço das dívidas, o estrangulamento da liquidez que as desonerações significaram para quem dependia entre 45% a 65% das transferências que foram lipoaspiradas.
Teria sido mais produtivo que o “quantum” dessas desonerações tivesse se transformado em “créditos a compensar” no pagamento das obrigações vincendas junto ao Tesouro, resultantes dos compromissos da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e de outras obrigações parcelamentos existentes junto ao Tesouro.
Ao contrário de alternativas que implicariam no custo (real e de imagem) de que se estaria “mexendo” na LRF o que poderiam abalar ainda mais a situação fiscal do país, a compensação de créditos, nas mesmas condições das dividas antes pactuadas, também traria o benefício da ampliação das margens de captação. E a diferença entre indexadores poderia ser por eles incorporada.
E ao lado de outras medidas que não significassem quaisquer alterações nas regras vigentes da LRF – tais como a dação dos créditos fiscais (certificados por auditorias independentes) junto ao setor privado –, poderiam abrir horizontes mais seguros para a obtenção de resultados primários mais consistentes para o setor público.
Com essa perspectiva – de situação fiscal estável ao logo do tempo – uma maior utilização das operações concessionadas pode levar em conta:
01. Recomendar a leitura dos vetos à Lei Federal 11.079, encaminhados pela Mensagem 1006: notadamente o então inciso II do Artigo 11, que na redação original vedava ao parceiro privado a elaboração do projeto básico nas PPP. Assim, negava-se o que já era (como é) patente na experiência internacional, ou seja, a eficiência e a inovação introduzida nos projetos ao se fazer tanto o projeto básico quanto o projeto executivo, eliminando os riscos e custos de desconformidade quando os mesmos são feitos por agentes diferentes. E responsabilizando o parceiro privado na Matriz de Riscos por eventuais desconformidades na concepção e elaboração dos projetos. Este entendimento parece ainda não ter sido de todo superado, seja pelos órgãos do Poder Concedente na elaboração de projetos de chamamento público seja por órgãos de controle externo (notadamente os tribunais de contas), ao apreciar a Matriz de Risco (tanto de PMI quanto de MIP), que parametriza as responsabilidades e os riscos nas operações de PPP. Da mesma forma, recomendar a leitura dos instrumentos que possibilitam aos formuladores de projetos virem a participar dos certames de Concessões e PPP (ou seja, tal como dispões a Lei 9.074 de julho de 1995 em seu capítulo IV, das Disposições Finais, em seu Artigo 31). Da mesma forma, o que consta no Capítulo I das Disposições Preliminares da Lei 11.079 em seu Artigo 3o. Isto pode evitar que órgãos de controle externo obstem situações análogas a estas (tal como já aconteceu em pelo menos um certame para investimento em complexo esportivo) quanto a impedir ressarcimento a elaboradores de projetos de concessão plena.
02. Criar critérios de Habilitação Econômica e Financeira e de Habilitação Técnica, para licitantes individuais e/ou que venham a se consorciar, que priorizem o que é de fato mais relevante nas operações de Concessão e, notadamente, nas operações de PPP: ou seja, a atividade de OPERAÇÂO (OPEX) que se realizarão sobre os ativos formados (CAPEX) por meio dessas operações. É uma forma de se evitar que se formem consórcios que irão se desfazer quando terminarem os prazos de fruição do bens ou dos financiamentos das operações de longo prazo, e se formem duopólios ou monopólios privados em áreas de concessão (como na época das concessões de estradas onde os mais de 30 consórcios de operações rodoviárias se transformaram em poucas empresas operadoras de transporte, ao longo do tempo). Assim, critérios de tamanho de Patrimônio Líquido (EXIGÍVEL) deveriam ser substituídos por critérios de montante de recebíveis gerados por contraprestações em projetos de PPP ou de rendas futuras de prestação de serviços em projetos de concessão (VOLUME DE RENDAS A RECEBER POR SERVIÇOS PRESTADOS, ou FATURAMENTO DE CONCESSÔES).
03. Permitir que Projetos de implantação de unidades de atendimento primário de saúde (hospitais assim como UBS e UPAS) assim como projetos de implantação de vagas em regime aberto para a ressocialização de presos – pela amplitude de politicas públicas que extravasam o âmbito estadual e municipal (este, no caso específico dos equipamentos de saúde) – sejam sempre desenvolvidas em CONSÓRCIO entre o poder federal e o poder público dos entes federados. Neste caso, o Fundo Garantidor das PPP seria sempre provido pelo ente federal, via a ainda misteriosa e anônima ABGF – ouvido o respectivo âmbito regulador, seja o Ministério da Justiça para o caso da política penitenciária, seja o Ministério da Saúde, no caso do atendimento primário das unidades de saúde. Com isto, atende-se à superação de meios para se prover garantias para projetos públicos em áreas onde OU existe interesse privado, mas inexiste margem de 5% de RCL ou para se atender às contra garantias às operações de PPP, OU não existe interesse do agente privado para o investimento no atendimento primário (ou de porta aberta).
04. Permitir que até 20% do recursos que compõem o saldo médio do valor do compulsório dos bancos, esterilizados sem remuneração junto à Autoridade Monetária, possa ser considerado como recursos que compõem o capital da misteriosa e ainda anônima ABGF, para fins de prover as diferentes formas de garantia, aval e fiança, que esta instituição pode prover às operações concessionadas que serão por ela contra garantidas.
05. Permitir que as Organizações Sociais (OSS) possam ser consideradas e admitidas como parceiras consorciadas do setor privado nas SPE articuladas para desenvolver projetos nas áreas de Saúde e Educação, SEM PERDER as suas imunidades e isenções tributárias e fiscais (assim como manteriam suas contrapartidas a fornecer os níveis de governo que as desoneraram de tais obrigações). Isto também permitiria que as atividades desenvolvidas por essas organizações em atividades fim (como no provimento de serviços de bata branca nas áreas de saúde) pudessem ser contratadas pelas operações de PPP ao invés de serem contratadas sem licitação pelo Setor Público a preços que, ao longo do tempo, vêm retirando a competitividade vis a vis a contratação pelos moldes tradicionais realizada pelo governo enquanto administração direta.
06. Prover governança aos fundos e fontes dotadores de recursos de longo prazo na economia – o FAT, o FGTS, o PIS PASEP, o FMM, o FUMPRESP e afins, inclusive aquelas de âmbito estadual e municipal – para que eles possam destinar parte de seus recursos TAMBÉM aos bancos privados que lhes submeteriam DIRETAMENTE a avaliação de projetos de Concessão e PPP. Além de transferirem para estas fontes as garantias públicas e privadas envolvidas na realização dos Projetos de PPP e Concessões, as instituições privadas também garantiriam essas operações. Com isso, se desonera o custo das captações dos financiamentos pela eliminação de duas componentes básicas (os spreads de intermediação e o custo dos empréstimos ponte quando esses recursos são repassados pelos bancos públicos) além de evitar custos para o Tesouro Nacional, que capta dinheiro selicado que irá gerar renda de crédito com base em TJLP.
07. Como desdobramento da disposição anterior, os recursos captados diretamente pelos bancos privados junto aos fundos e fontes dotadoras de recursos de longo prazo, seriam desdobrados em “recursos de dívida” e “recursos de equity”, com diferentes prazos de retorno e de ressarcimento às fontes dotadoras, sempre respeitando que no montante total dos investimentos, o valor das operações apoiadas, o empreendedor privado (isoladamente ou consorciado), sempre aportaria um mínimo de 20% do montante dos recursos a serem mobiliados.
08. Priorizar ações de PPP e Concessões levando-se em conta não apenas o PROJETO, mas, mais além, o complexo de negócios que seriam objeto das operações de Concessão e PPP. Embora, sem dúvida, como bem demonstram as metodologias de PSC e de Value for Money existam economias de gestão, de produtividade e de orçamentos quando determinadas atividades são realizadas através das PPP – vis a vis às mesmas operações quando realizadas pelo setor público por seus instrumentos tradicionais --, é preciso evoluir para uma visão mais ampla dos projetos de Concessão e PPP. Quando se olha todo o espectro de negócios envolvido em uma operação concessionável (por Concessão Plena e por PPP) pode-se até cogitar até que as gratuidades previstas em determinados projetos sejam cobertas pelas rendas acessórias e complementares geradas pelo contexto de negócios envolvidos. Por exemplo, projetos de moradia de baixa renda, pela escala que demandam, são também germinadores de rendas de atividades acessórias e complementares como as rendas do uso de energia elétrica e gás encanado, uso de meios de telecomunicações (imagens, voz e dados via internet, telefonia e TV a cabo popular), rendas de uso de ativos no entorno dos bairros ou mini - cidades, e assim por diante.
09. Utilizar os projetos concessionados (no âmbito de concessões e de concessões via PPP) como projetos indutores de inovação tecnológica e de gestão. Basta lembrar que os primeiros projetos de concessão no Brasil há mais de 160 anos, introduziram inovações importantes: as ferrovias e portos introduziram inovações nas áreas de transporte e logística. E permitiram reduções significativas nos custos de transportes (que se refletiram em menores preços de consumo pessoal e interindustrial), assim como criaram novos meios de mobilidade para as pessoas e para os prestadores de servos de armazenagem e de comercialização. Já a primeira PPP de Iluminação Pública em 1850, gerou o uso de novas tecnologias na iluminação Pública, que também redundaram em novas atividades industriais e de prestação de serviços numa economia ate então primário exportadora por excelência.
10. Generalizar o uso dos Fundos de Investimento como veículos de mobilização de recursos para projetos de longo prazo, a serem criados por licitação pelo Poder Público, com personalidade jurídica própria, onde além da composição acionária imanente dos sócios cotistas dos Fundos – com governança e acordos de acionistas pertinentes --, também prevê a criação de SPE que será a contratante das operações junto aos demandantes de projetos de PPP e Concessões. Estes veículos seriam criados para carregar as operações nas áreas cobertas pelas políticas públicas. E, como iriam ao longo dessas operações concessionadas, gerar ativos e serviços que ao final seriam repassados ao setor público que promoveu a sua constituição, teriam a mesma capacidade das empresas da administração indireta quando promovem essas operações. Ou seja, as atividades desenvolvidas pelos FUNDOS não impactariam os 5% de uso da RCL previstas para as operações de PPP, por exemplo. Quando não houver a geração de tarifas para sustentar os retornos (envidando operações via concessões administrativas), as SPE dos Fundos poderiam ter o desenho jurídico das Autarquias, durante o prazo das concessões, de forma a que recebam as contraprestações públicas sem direito a retornos de tarifação.
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