Já em 2003, ano do decantado apagão, e pela tradição que sempre manteve na discussão e no encaminhamento de soluções para as questões de políticas públicas, o Instituto de Engenharia de São Paulo (IE) realizou um Seminário alertando para o estresse hídrico a que a região metropolitana de São Paulo estava sendo severa e sucessivamente submetida.
A par de realizar um diagnóstico preciso da situação, o IE e propunha soluções concretas para atuar sobre as causas do problema que já naquela época se refletia na forma de uma crise de abastecimento: entre elas, um ano antes da Lei Federal de Parcerias Público Privada, propunha estabelecer ...”parcerias entre o setor público e privado objetivando a viabilização econômica recursos para estes empreendimentos”.
Naquela época, os 39 municípios da Grande São Paulo tinham 17,8 milhões de pessoas: hoje (FIBGE 2013) já são 20,8 milhões de pessoas respondendo por quase 20% de toda a riqueza nacional.
As propostas sugeridas pelo IE e encaminhadas ao poder público não foram seguidas. Notadamente no que consistia em incorporar ao Plano Diretor de Abastecimento de Água da RMSP (então em formulação final pela SABESP) soluções de grande porte e finalizando as obras do Sistema Produtor Alto Tietê. Ao mesmo tempo preconizava urgência em se adotarem posturas preventivas para reduzir o consumo agregado em pelo menos 5%, a par de medidas como o uso de águas subterrâneas para incrementar a oferta que seria estrangulada por fatores de ordem orgânica.
Ou seja, problemas endógenos, previsíveis por conhecidos, por si só agravariam a situação critica de 2003; fatores exógenos, imprevisíveis porque desconhecidos e fora do controle e da previsão (como o aquecimento do planeta ou uma restrição hidrológica) tenderiam a agravar a situação ainda mais.
No mesmo horizonte de tempo, também são outras as condições da conjuntura (e, portanto, da capacidade de uma parceria entre os agentes púbicos e privados compartilhares esforços para mobilizar ações e recursos demandados para o esforço de investimento que a tarefa exigia ontem (como hoje impõe): estados e municípios estão em um momento de geração negativa de popanças fiscais líquidas. E o setor privado da engenharia de grandes obras, estrangulado em seus limites de endividamento (pelo engajamento em projetos de concessões e PPP entre outros).
O Estado de São Paulo – o segundo orçamento do país –, nominalmente apresenta uma situação invejável (2013): R$ 129 bilhões em Receita Corrente Líquida (RCL), o que enseja uma capacidade nominal de aportar até R$ 6,4 bilhões ao ano como contra garantias pecuniárias em projetos de PPP realizados pela administração direta (isto é, sem considerar projetos de concessão plena ou patrocinada que pode realizar pelas empresas da administração indireta).
Embora a eficácia da gestão fiscal recente lhe permita níveis maiores de endividamento em relação à RCL (na ordem de 200% da RCL), o fato é que a gestão estadual carrega dívidas que ela não gerou. Mas, que fazem com que os seus custos de carregamento, deixem o montante próximo do limite de alerta deste indicador (uma diferença de R$ 13 bilhões em termos de endividamento bruto e de R$ 47 bilhões, em termos de endividamento líquido). Mas, restos a pagar da ordem de R$ 13 bilhões, diminuem esta margem para algo como R$ 34 bilhões ao ano (R$ 2,8 bilhões mensais).
Dada a ocupação de limites de alavancagem da tomada de recursos de investimento pelo setor privado, há que se repensar o esforço de investimento.
Primeiro, saindo da lógica de projeto para a lógica de negócios gerados pelas concessões (plenas, patrocinadas ou administrativas): é uma maneira de se criar receita acessória que, ou gere menores contraprestações e comprometimentos por parte dos agentes públicos ou, no limite, até outorgas diretas e indiretas a serem pagas pela germinação de ganhos embutidos nos investimentos de caráter publico a serem realizados.
Segundo, fazendo com que o contratante dos projetos não seja aquele que os execute (CAPEX ou OPEX): mas, empresas de proposito específico (SPE), sob a égide de Fundos de Investimento, cujos regulamentos prevejam não só a captação de recursos para constituir garantias exigíveis nos processos licitatórios – o que significa eventual dívida das SPE dos Fundos e não de seus cotistas – assim como a contratação dos capexistas e opexistas, o que os isenta da dação de garantias outras que não sejam as garantias de “fazer e entregar” que normalmente já apresentam em processos licitatórios convencionais.
Estas ações cominadas diminuem custos intermediários de transação muito importantes: para os agentes privados, por não precisarem precificar custos e despesas por oneração de patrimônio de sócios e de empresas. Ou por não incorrerem em custos de empréstimos-ponte até que o longo processo da análise de créditos em bancos públicos seja afinal concluído. E, na inexistência da cultura de Project Finance no país, de imobilizar garantias ou fianças no longo ciclo de custeio financeiro de operações de concessão.
Para os agentes públicos, porque desonera as contraprestações em épocas de poupança fiscal minguante. Ou por transformar, em casos particulares, quando se interpolam projetos ou se muda a ótica, de projetos para negócios, saídas de caixa (contraprestações) em entradas de caixa (outorgas diretas e indiretas).
No caso das águas, os investimentos necessários se aproximam dos R$ 10 bilhões.
Urge se licitar a criação de uma SPE, cujo passivo (fontes de recursos) seja constituído pela captação de recursos na forma da colocação de cotas de um Fundo de Investimento. E cujo ativo (usos dos recursos) seja constituído tanto pelos ativos que serão criados sob a forma de ativos concessionados ao setor privado (e ao final da concessão repassados para o poder público) quanto pelos recebíveis oriundos do uso das águas pelas prefeituras como pelos consumidores e pelas empresas que utilizarão os produtos e serviços que serão investidos, operados, mantidos e geridos pela SPE até a maturação final do projeto.
Para um PIB de quase R$ 5 trilhões, há quase R$ 3 trilhões de recursos girando em poupanças voluntarias, em mais de 15 mil fundos de diversas modalidades que carregam, em sua maior parte, recursos sem lastro real.
A queda dos juros (ou efeitos deletérios como os da crise de 2008), pode criar um descasamento entre ativos e passivos, muito forte, no patrimônio destes Fundos.
Parte destes recursos pode ser investida em cotas de projetos de concessão (portanto, lastreados na formação de capital de bens de infraestrutura e de ativos que geram outorgas sob concessão) e que proveem hedge (lastro) real e retornos reais sob menor risco, que precisam ser considerados pelos comitês de investimentos destes fundos no país.
E também do exterior, eis que lá já não há mais espaço para a formação de grandes ativos de infraestrutura. Muito menos com as taxas reais de retorno dos grandes projetos como os de águas, com demanda reprimida e de consumo vital, como os projetos na área de águas (ETA e ETE) demandados em nossos grandes e sobre ocupados centros metropolitanos e sempre demandados e reclamados pelos membros do Instituto de Engenharia.
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