Artigo: O governo federal e o desafio de melhorar o ambiente de negócios para as PPPs

A Presidenta Dilma Rousseff iniciará nos próximos dias seu novo mandato e, recentemente, foram divulgados os nomes dos indicados para as funções de Ministro da Fazenda e do Planejamento, Joaquim Levy e Nelson Barbosa, respectivamente.

Ambos sinalizaram em suas primeiras declarações que pretendem ampliar o uso das concessões e parcerias público-privadas (PPP). É possível também compreender em suas declarações, ao menos indiretamente, que há um esgotamento no modelo de financiamento de longo prazo pautado nos bancos públicos, de modo que será necessário incentivar e desenvolver mecanismos alternativos para o financiamento de longo prazo no Brasil.

Tais notícias são animadoras para quem acompanha os mercados de concessões e PPPs. Entretanto, no atual cenário, até mesmo algumas boas notícias têm seus limites. Considerando que parte das expectativas criadas em 2012 com os anúncios do Programa de Investimentos em Logística (PIL) não se concretizaram, principalmente em portos e ferrovias, é necessário que a tendência do governo federal a favor das concessões e PPPs deixe definitivamente o campo da retórica ou das necessidades circunstanciais, tornando-se, de fato, uma política pública orgânica, perene, previsível, estável e transparente.

Nesse contexto, abaixo serão apresentadas algumas medidas que poderiam contribuir para que as concessões e PPPs alcançassem o patamar que, ao que parece, espera-se que alcancem nos próximos anos enquanto modelos de contratação pública cuja promessa é o gasto público de qualidade.

Tornar a ABGF operacional: a criação da Agência Brasileira Gestora de Fundos e Garantias foi autorizada em 2012, a empresa foi constituída, e hoje já conta com orçamento e profissionais. Entretanto, é necessário que a ABGF crie e torne operacional a sua política de compartilhar riscos em projetos de PPPs dos Estados e do Distrito Federal. Essa medida pode incentivar boas práticas nos entes subnacionais que pretendem contratar PPPs e, ao mesmo tempo, poderá contribuir para que eventuais projetos estaduais represados possam ser contratados nos próximos anos.

Efetivar o papel do CGP: O Comitê Gestor de PPP Federal precisa ser repensado. O órgão, atualmente composto pelos Ministros do Planejamento, Fazenda e Casa Civil, sofre de um imobilismo decisório que ceifa o ânimo dos poucos abnegados que, nos últimos anos, tentaram promover projetos de PPP em âmbito federal, especialmente do Ministério da Defesa e das Forças Armadas. A governança e a tomada de decisão sobre PPPs no governo federal precisam ser revitalizadas, inclusive com a fusão do CGP e do Conselho Nacional de Desestatização (CND), transformando-os em um novo órgão.

Estabelecer plano e prioridades: para que haja de fato um rompimento positivo e gerador de valor no campo das PPPs, é necessário que o governo federal prepare um plano e uma política pública efetiva para o uso das PPPs, divulgando-o até junho de 2015. O resultado deste esforço será uma carteira de projetos priorizada e que será gerida com seriedade. Há espaço para inovação na comunicação e no diálogo com os atores relevantes (gestores públicos, mercado, bancos, imprensa, academia, cidadão), o que contribuiria para que o plano não seja apenas mais uma apresentação de slides com mapas da infraestrutura e dos serviços públicos que queremos no Brasil, mas que ainda não existem.

Difundir conhecimentos sobre PPPs nos Ministérios e órgãos federais: é necessário formar centenas de gestores públicos federais, estaduais e municipais sobre o tema das PPPs. Sem que tais gestores sejam no mínimo sensíveis ao tema, dificilmente as políticas públicas pretendidas sairão do papel. A Escola Nacional de Administração Pública (ENAP) e a Escola de Administração Fazendária (ESAF), em cooperação com instituições de ensino nacionais e internacionais, poderiam contribuir com esse desafio.

Descentralizar recursos federais via PPPs subnacionais: o governo federal deveria ampliar suas políticas de descentralização de recursos aos entes subnacionais via contratos de PPP, buscando mecanismos que sejam ótimos ou neutros do ponto de vista tributário. O que foi feito em alguns dos projetos do PAC Mobilidade precisa ser replicado em outras áreas, como segurança pública, saúde e educação. O governo federal poderia realizar efetivas competições de mérito pelos recursos: os entes subnacionais que apresentarem os melhores estudos de viabilidade no modelo de PPP acessarão os recursos mais rapidamente. Esse seria mais um incentivo para que as PPPs se enraizassem nos entes subnacionais.

Estabelecer cláusulas padrão de contratos de PPP que incentivem o desenvolvimento de alternativas para financiamentos de longo prazo: um dos maiores descompassos do mercado brasileiro de PPPs é não termos múltiplas e competitivas opções de financiamento de longo prazo. Os bancos privados, a despeito das medidas de incentivo do governo federal nos últimos anos, ainda são mais cautelosos do que agressivos sobre as PPPs. Nesse contexto, é necessário que sejam estabelecidas cláusulas padrão sobre aspectos dos contratos que influenciam diretamente a percepção de riscos dos financiadores (como garantia de performance, seguros, garantias no caso de inadimplemento do poder público, mecanismos de pagamento, etc.). Se tais cláusulas padrão fossem desenvolvidas em conjunto pelo governo federal e pelas instituições financeiras, poderíamos ter consensos mínimos que permitissem a gradativa redução do papel dos bancos públicos no mercado de financiamento de longo prazo e a crescente ampliação da participação dos bancos privados e do mercado de capitais.

Incentivar a participação de investidores institucionais: o governo federal poderia estabelecer um grupo de trabalho com representantes de investidores institucionais (seguradoras e fundos de pensão) com o objetivo de desenvolver uma política de atração de recursos para investimento em PPPs. Nos últimos anos, o governo britânico se organizou para desenvolver um alinhamento como este (a tentativa foi denominada Pensions Infrastructure Platform). O governo federal deveria compreender a experiência britânica, suas lições e analisar a viabilidade de tentar algo similar para o Brasil. Esse é um esforço que deve apresentar resultados quando a carteira de projetos de PPP federal estiver madura, no fim de 2015 e durante 2016.

Aprimorar o papel do STN: a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) deve deixar de ter um papel de mero repositório de informações enviadas pelos entes subnacionais sobre PPPs e passar a ter papel mais ativo no apoio aos Estados e Municípios diante dos desafios que enfrentam na gestão de seus contratos de PPP, principalmente do ponto de vista de medidas que contribuam com a transparência fiscal, permitindo que os orçamentos públicos reflitam passivos contingentes decorrentes das PPPs. Adicionalmente, é urgente que a STN tente produzir diretrizes para que tenhamos uma referência nacional sobre a análise de custo e benefício da opção por contratar uma PPP em comparação com modalidades de contratação pública tradicionais.

Apoiar a Rede Intergovernamental de PPPs: foi criada em 2014 a Rede Intergovernamental de PPPs, composta por representantes de Unidades de PPP de Estados e Municípios brasileiros. O governo federal deveria apoiar esta iniciativa, contribuindo para que a experiência nacional com PPPs possa ser aprimorada mediante a sistematização de melhores práticas e lições aprendidas.

Os países desenvolvidos gastam muita energia para implementar políticas públicas que incorporem a participação da iniciativa privada no provimento de infraestrutura e serviços públicos. É necessário que o governo federal compreenda de uma vez por todas que a inércia não gerará os resultados esperados. Os papéis de liderança e coordenação de diversos órgãos federais e subnacionais são essenciais para que algumas das pautas de interesse público sejam satisfeitas via contratos de concessão e PPP. Que esse seja um legado institucional da gestão que se inicia em janeiro de 2015.

Versão resumida deste artigo foi publicada originalmente no portal da Folha de São Paulo (Tendências/Debates), em 19 de dezembro de 2014

(Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do PPP Brasil. O portal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações).

Share this

Desenvolvido em Drupal por Garcia & Rodrigues