Artigo: Um novo impulso para as concessões públicas

Falta fazer uma pergunta crucial àqueles que defendem diferentes taxas internas de retorno para os diversos projetos de concessão que o Governo Federal planeja levar à licitação neste segundo semestre: os Projetos de Concessão apresentados são de fato bons negócios?

Afinal, bons negócios não precisam ser cercados de tantos artifícios para tentar atrair capitais: não há incentivo ou subsídio, garantias colaterais, salvaguardas, antecipações ou vantagens capazes de transformar um mau negócio em um bom negócio.

Na queda de braço entre o que se oferta de TIR (pelo Governo) e o que se deseja de TIR (pelo setor privado), não se está confundindo taxa de retorno com a taxa de risco do projeto?

Os Projetos de Concessão são desenvolvidos em horizontes de tempo bastante longos: pelo menos 25 anos, num país que conviveu tempo demais com taxas de inflação muito elevadas.

E que, apesar do muito que se evoluiu do Plano Real para cá, ainda não conseguiu fazer de todo a lição de casa do ajuste fiscal definitivo (no setor público) ou o ajuste da produtividade efetiva (no setor empresarial).

Nem se livrar da ancoragem dos juros reais (que continuam a gerar ganhos maiores que os ganhos de operação dos projetos de investimento, de concessão ou não; notadamente se financiados pelo sistema BNDES).

Por outro lado, salta aos olhos o quanto se falta fazer na infraestrutura pública, quando se percebe a escassez de Projetos de Concessão na modalidade de PPP de estados e municípios vis a vis às ofertas de concessões públicas do governo federal.

Nos entes federados estaduais e municipais, são muito raros os projetos que podem ser objeto de concessões “plenas”, sustentados por tarifas ou preços que se podem cobrar de usuários finais como os que se utilizam das rodovias sustentadas por pedágios ou pesagem de cargas, ou o fretamento de cargas via ferrovias e hidrovias, ou ainda, o transporte de passageiros e de cargas por aeroportos.

A maior parte das carências da infraestrutura é aquela que levou o povo às ruas, nas áreas de transporte público que precisa ter a sua rentabilidade bancada ou complementada pelos tesouros estaduais e municipais, emagrecidos pela desoneração dos impostos que sangram os Fundos de Participação dos Estados e Municípios (FPE e FPM), ou pelas incertezas maiores da política macroeconômica que diminui a arrecadação corrente em face de obrigações fiscais irrecorríveis em outras áreas também críticas e sensíveis como a saúde e a educação.

E os eleitores não estão na federação ou nos estados: estão nas cidades que também, devido à estiagem fiscal, não tem condições de constituir os fundos garantidores das suas concessões administrativas ou patrocinadas.

Nem os entes federados estão buscando alternativas, como rentabilizar o extenso patrimônio imobiliário, securitizar a dívida ativa ou utilizar os fundos de investimento (FIP IE) para alavancar projetos de formação de capital nas áreas de concessão plena e através das PPP.

Assim, nas cidades onde se vota e onde se têm os horizontes de investimentos maiores – devido às eleições, o ano fiscal da federação e dos estados se esgota daqui a 09 meses, em junho de 2014 – é onde estão os projetos com demanda final reprimida e retorno garantido – e onde não há ajuda do Governo Federal via a esperada ABFG (a empresa federal que poderia dar a contraparte em fundos garantidores para os projetos de estados e municípios sem capacidade fiscal).

E, afinal, o prefeito é quem elege (ou ajuda muito ou prejudica muito a eleger) o governo estadual e o governo federal: notadamente depois do despertar recente das ruas.

Por outro lado, junto ao investidor local e ao investidor estrangeiro potencial que ajude a alavancar as concessões, o governo fez muito pouco além de discutir a TIR dos projetos em referência.

Os grandes players privados nacionais estão com seus limites de créditos tomados junto ao BNDES (assim como logo estarão tomados junto à CEF e ao BB): o tal uso de parcelas dos depósitos compulsórios não remunerados nas concessões caiu no esquecimento.

Agora se querem consorciar na empreitada os bancos privados: para quê? Os banqueiros nacionais não tem cacoete de investidor: são corretores rentistas de títulos públicos e coletores de impostos e prestadores de serviços regiamente tarifados. Quem tem que investir é o empreendedor privado. Ou os fundistas P.O. (Puros de Origem), não os que querem “financiar equities”...

Banqueiro investindo em concessões? Para quê arriscar aplicar no longo prazo se o desarranjo fiscal ajuda a calibrar a taxa real de juros de novo para cima (o que é o paraíso para a tradição rentista dos bancos nacionais e nacionalizados); de outro lado, com os limites encalacrados nos bancos oficiais, e a morosidade dos bancos públicos, os empréstimos-ponte são o paraíso do rentismo impregnado no DNA dos nossos banqueiros; e se, num plano mais elevado ainda, a capitalização dos bancos públicos leva o governo a captar à SELIC e emprestar à TJLP, se aumenta ainda mais a fossa fiscal, requerendo mais o juro real, levando a um prazer quase orgástico na obtenção de renda financeira sem gerar produção e sem fazer força?

Para os players privados estrangeiros, o governo sequer estruturou um Fundo de Investimento em cada um de seus bancos públicos, para ter o caminho institucional para trazer os recursos externos cobiçados (e cortejados em uma meia dúzia de road shows e jantares  de prêmios internacionais).

Assim, ao que parece ainda resta o governo:

01.  Mudar o critério das concessões: independente da TIR vence a licitação quem der ao governo a maior outorga. Com o ágio se esterilizam as tarifas na operação dos Projetos de Concessão Plenas.

02.  Reforçar os Projetos de PPP nos entes federados, notadamente nos projetos de saúde, educação, ressocialização de presos, moradias populares, além dos da mobilidade, em resposta à população. Notadamente através da decantada ABFG – que está se tornando a verdadeira “canela de freira” da politica das PPP – “que todo mundo sabe que existe, mas ninguém vê”.

03.  Separar taxa de risco de taxa de retorno: a taxa de risco, a “canela”, ou melhor, a ABFG banca, até para não se precificar o risco no preço relativo das concessões e PPP.

04.  E fazer parceria com bancos usando os recursos “deles”, que hoje não rendem no compulsório: porque para “aplicar” dinheiro do BNDES, apenas por 10 anos de prazo, e com aval da ABFG até eu quero!

05.  Mudar o padrão de financiamento das concessões: usar os FIP IE como veículos nos entes federados premidos pelo estrangulamento fiscal, desonerando os 5% da RCL e criando ativos sem criar empresas estatais (ou onerando as já existentes), pelo uso das SPE criadas pelos FIP IE. 

Tudo o mais parece não fazer mais qualquer diferença para este ciclo de governo e suas politicas (?) de longo prazo.

 

Artigo publicado originalmente no Valor Econômico, em 16 de setembro de 2013

(Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do PPP Brasil. O portal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações).

Share this

Desenvolvido em Drupal por Garcia & Rodrigues