É possível falar muitas coisas sobre Mauricio Portugal Ribeiro. Para mencionar apenas algumas, Mauricio é advogado e professor; um profissional reconhecido (quer seja no setor público, quer seja no setor privado) e uma figura ativa no mercado de ideias a respeito das práticas e políticas que possibilitam o investimento privado em infraestrutura.
Recentemente, Mauricio Portugal Ribeiro lançou um novo livro, em que aborda as melhores práticas em licitações e contratos de PPP (“Concessões e PPPs – melhores práticas em licitações e contratos”, Editora Atlas).
Anteriormente, em co-autoria com Lucas Navarro Prado, Mauricio havia publicado “Comentários à Lei de PPP – fundamentos econômico-jurídicos” (Malheiros Editores, 2007), livro esse que foi reimpresso em 2011.
Entramos em contato com Mauricio Portugal Ribeiro para uma rápida entrevista a respeito de seu livro, que, sem dúvida, é uma valiosa contribuição para o aprimoramento do debate público brasileiro a respeito das PPPs. Abaixo, transcrevemos o inteiro teor da entrevista realizada por e-mail e reforçamos o agradecimento pela colaboração do entrevistado (as questões foram formuladas por Bruno Ramos Pereira).
PPP Brasil. Você poderia se apresentar brevemente para aqueles que não o conhecem?
Mauricio P. Ribeiro: Sou especialista em aspectos jurídicos da regulação do provimento de infraestrutura por meio de participação privada, e na estruturação de concessões e PPPs nos setores de infraestrutura. Atualmente sou sócio do Portugal Ribeiro, Dias & Prado Advogados e Professor da FGV Direito-Rio de Direito de Infraestrutura.
Trabalhei nos últimos 15 anos com esse tema nas mais diversas posições. Primeiro como advogado, condição na qual fui responsável pela estruturação de vários projetos e assessoria a clientes nos setores de Telecom, Energia, Disposição de Resíduos Sólidos, Ferrovias, Rodovias, Inspeção Veicular etc. depois como consultor do BID coordenei a redação da minuta de Projeto de Lei que se tornou a Lei 11.079/04, Lei de PPP; a seguir, como agente público, Diretor da Unidade de PPP do Governo Federal, coordenei a reforma da Lei 8.987/95, realizada em 2005, e fui membro do conselho de administração da CHESF (maior geradora de energia do país), da CEG, companhia concessionária da distribuição de gás para o Estado do Rio de Janeiro, e da Acesita, maior siderúrgica especializada em aços especiais da América Latina; a seguir fui responsável por toda área de dívida do Citibank no Brasil para os setores de infraestrutura e público; depois disso, fui chefe da área de consultoria em infraestrutura para o Brasil do IFC (órgão do Banco Mundial), condição na qual liderei o time que prestou consultoria a Governos na estruturação de diversas concessões e PPPs inovadoras. Estruturamos por exemplo, a primeira PPP de Hospital, que foi a primeira no setor de saúde no Brasil; a primeira PPP de escolas, a primeira concessão de rede de rodovias etc.
Publiquei diversos artigos nessa área e participo até o presente de diversas conferências nacionais e internacionais sobre o assunto. E sou Mestre em Direito (LL.M. 2004) pela Harvard Law School.
PPP Brasil. Você está lançando um livro denominado “Concessões e PPPs – melhores práticas em licitações e contratos” (Editora Atlas). Qual o objetivo do livro e quais foram as circunstâncias que o motivaram a escrevê-lo? Além disso, quais as maiores dificuldades enfrentadas durante a execução da pesquisa com base na qual o livro foi desenvolvido?
Mauricio P. Ribeiro: O objetivo do livro é disseminar a experiência em estruturação de editais e contratos de concessão e PPPs, que adquiri nos últimos 15 anos trabalhando com projetos de infraestrutura, nas mais diversas perspectivas, como advogado, agente público, financiador, consultor do Governo ou da iniciativa privada.
O que me motivou a escrever o livro foi o fato de, apesar de o Brasil ser o país do mundo em desenvolvimento que fez o maior processo de envolvimento de participação privada em infraestrutura (se excluirmos para esse efeito as economias em transição), não há ainda entre nós um livro que trate dos dilemas práticos enfrentados por quem tem diante de si o desafio hercúleo de estruturar uma concessão ou uma PPP, em setores como telecomunicações, energia elétrica, petróleo e gás, rodovias, portos, ferrovias, aeroportos, metro, etc. Tampouco há entre nós, um livro que explique a lógica que deve presidir a interpretação e aplicação de editais de licitação e de PPP. O livro “Concessões e PPPs: melhores práticas em licitações e contratos” vem para preencher essas lacunas.
O livro foi desenvolvido com base na experiência que acumulei, de maneira que o principal desafio foi estruturá-lo de forma clara, acessível a um não especialista, de forma a transmitir as preocupações e a racionalidade por trás da estruturação dos editais de licitação e dos contratos de concessão nos mais diversos setores de infraestrutura.
PPP Brasil. Qual o tópico do livro que você considera ser o mais desenvolvido? E qual é a aquele que, na sua opinião, você gostaria de ter tido mais tempo para desenvolvê-lo?
Mauricio P. Ribeiro: Acho que o livro de um modo geral desenvolve os temas que trata com muito mais detalhe e foco nos aspectos econômico-jurídicos do que a literatura brasileira sobre o assunto.
Creio que a primeira parte do livro sobre a estruturação de editais de licitação e especialmente sobre o modo como devem ser estruturados os requisitos de qualificação econômico-financeira e técnica para setores maduros, maduros com vários entrantes, imaturos, ou de maturidade média é a parte mais bem desenvolvida da obra.
No livro há em torno de 40 páginas sobre o tema da matriz de riscos e do equilíbrio econômico-financeiro das concessões e PPPs. E há umas 15 páginas com uma matriz de riscos padronizada que elaborei com base na experiência brasileira em diversos setores. Nessa matriz de riscos tem informações sobre os principais riscos a serem alocados, sobre o tratamento legal de cada um desses riscos, e a quem em regra ele deve ser alocado.
Mas o tema que eu aprofundaria mais é o tema do equilíbrio econômico-financeiro porque creio que a teoria jurídica do Direito Administrativo brasileiro não compreende adequadamente os fundamentos econômico-financeiros da proteção ao equilíbrio econômico-financeiro do contrato. Por essa razão, decidi, inclusive, escrever um livro específico sobre isso, que devo terminar no próximo ano.
PPP Brasil. Você concorda com a seguinte opinião: “o Brasil já conta com uma experiência relevante a respeito de contratos de concessão administrativa e patrocinada. O que falta agora é uma análise aprofundada sobre a qualidade e os resultados que as PPPs já celebradas apresentam”?
Mauricio P. Ribeiro: Concordo em parte, pelas seguintes razões:
Em primeiro lugar, acho que não há uma particularidade das concessões administrativas e patrocinadas que justifique separá-las da experiência geral do Brasil em participação privada em infraestrutura, sob a forma de privatização, concessão, permissão, autorização, arrendamento etc. nos mais diversos setores, telecomunicações, energia, rodovias, portos, aeroportos, água e saneamento etc.
Por outro lado, creio que ainda não foi feito no Brasil um trabalho sério de levantamento dos efeitos da experiência em participação privada em infraestrutura. Veja-se, por exemplo, o trabalho feito em 1997 por Rafael La Porta e por Florencio López-de-Silanes sobre o México ("The Benefits of Privatization: Evidence from México", Quarterly Journal of Economics, Novembro de 1999). Esse trabalho tenta comparar os dados sobre a eficiência da operação das empresas ou projetos quando realizada diretamente pelo Poder Público, com a eficiência da operação das mesmas empresas ou projetos quando realizada pela iniciativa privada, em diversos setores não financeiros em que houve participação privada em infraestrutura no México. Nada semelhante foi feito até o presente para o Brasil. Há apenas alguns trabalhos isolados, sobre setores ou projetos específicos.
É preciso notar, entretanto, que um trabalho desse tipo não é trivial e tem uma série de limitações metodológicas que precisarão ser enfrentadas para realizá-lo. Em primeiro lugar, há um problema sério de provimento de informações. Muitas vezes, é muito difícil saber quanto exatamente o Poder Público está gastando, por exemplo, com uma determinada rodovia, com uma determinada planta de geração de energia, com um determinado hospital etc. A contabilidade pública é feita de forma que vários custos são distribuídos em rubricas genéricas. Além disso, há outro problema metodológico que diz respeito à cláusula “ceteris paribus”, isto é à idéia de que as condições do contexto econômico em torno dessas empresas e projetos pré participação privada são iguais às pós participação privada, o que é algo difícil de sustentar se considerarmos as mudanças pelas quais o Brasil e toda a América Latina passaram nos últimos 20 anos. Por fim, há um problema sério de atribuição/causalidade em relação às melhorias da operação trazidas pela participação privada em infraestrutura: é difícil distinguir as melhorias que decorrem da operação privada per se daquelas que decorrem da reestruturação que as empresas e negócios sofreram para a realização da desestatização.
Todas essas questões teriam que ser enfrentadas em um estudo sério que mapeasse os ganhos de qualidade/custo, eficiência etc. da participação privada em infraestrutura no Brasil.
PPP Brasil. Em regra, quando surge o debate sobre as PPPs (e o que poderia ser feito para ampliar o uso desta modalidade de contratação no Brasil), logo surge a opinião de que seria necessário alterar o “marco regulatório” das PPPs. Eu, particularmente, acho essa opinião um pouco superficial. É frequente que o debate público brasileiro debite nas normas em vigor desafios que, na verdade, são desafios de gestão ou de aplicação inteligente do regime jurídico em vigor. O que acha desse ponto de vista?
Mauricio P. Ribeiro: Eu tenho um texto publicado sobre isso, que se chama “Condições Favoráveis e Dificuldades para Envolver Participação Privada em Infraestrutura no Brasil”.
Eu acho que as principais razões porque não se faz mais PPPs no Brasil são preconceito ideológico e corporativismo.
Por outro lado, acho que existem vários aspectos do nosso marco legal que são facciosos contra a realização de PPP e concessões e a favor da realização de obras públicas tradicionais. Esses aspectos precisam ser modificados. As questões são complexas, mas vou tentar explicá-las de forma simplificada.
A primeira é questão tributária que prejudica especialmente as concessões e PPPs estaduais e municipais. Do modo como está o marco legal sobre esse assunto, ocorrem dois problemas: primeiro uma espécie de dupla tributação, que na minha opinião constitui uma quebra indireta da imunidade entre entidades governamentais, e que deveria ser corrigida por mudança no marco legal sobre esse tema.
Dupla tributação porque o parceiro privado é tributado primeiro quando a SPE – Sociedade de Propósito Específico, concessionária do serviço, recebe a contraprestação do setor público (IR, PIS, COFINS). Depois, ela realiza um EPC (contrato de obra, geralmente por preço integral) com uma empresa privada de construção para implantar ou melhorar a infraestrutura objeto da PPP, que por sua vez tem que pagar novamente todos os impostos sobre os valores pagos pela a SPE pela obra.
Observe que se o Poder Público resolver fazer o mesmo projeto por meio de uma obra pública, os valores do pagamento da obra só são tributados uma vez, como receitas da empreiteira. Se, no entanto, o Poder Público resolve implantar o projeto por meio de PPP ou concessão, aí a União tributa novamente essas receitas quando elas são pagas à SPE concessionária do serviço.
O resultado disso é que fazer PPPs e concessões de projetos que envolvem obras relevantes pode ser em torno de 30% mais caro para o Estado e Município do que fazer diretamente sob a forma de obra pública. Note que, mesmo assim, em muitos casos a eficiência da operação privada (aumento da qualidade e redução do custo) tem compensado parcialmente esse custo adicional e o Poder Público estadual e municipal tem decidido fazer o projeto por meio de PPP ou concessão.
Uma outra facciosidade contra as concessões e PPPs pode ser encontrada nas transferências de recursos federais para investimento pelos Estados e Municípios por meio do PAC – Programa de Aceleração do Crescimento. No setor, por exemplo, de águas e saneamento, os recursos disponíveis no Governo Federal para isso são facilmente acessíveis se o destinatário desses recursos for, por exemplo, uma empresa estadual de saneamento, ou uma autarquia municipal. É, contudo, extremamente difícil usar esses recursos nos casos de Municípios que têm contratadas concessionárias privadas de serviços de água e saneamento e querem usar essas transferências para custear, por meio dessas concessionárias, obras de expansão da cobertura da rede de água e esgoto. Isso precisa ser mudado, porque não faz nenhum sentido.
PPP Brasil. No passado recente da experiência contratual brasileira em concessões (desde 2000), é possível detectar uma preocupação maior com o tema da alocação de riscos e do equilíbrio econômico-financeiro. Desconsiderando a análise do mérito das alocações de riscos estampadas nos contratos de concessão brasileiros, você concorda com a opinião de que as cláusulas sobre alocação de riscos são cada vez mais frequentes e isso é um ponto positivo por si só? No que diz respeito ao tema dos riscos e do equilíbrio econômico-financeiro, quais são os próximos desafios a serem enfrentados quanto ao desenho dos contratos de concessão brasileiros?
Mauricio P. Ribeiro: A alocação de riscos é uma das partes essenciais de qualquer contrato. Ela basicamente estabelece qual das partes é responsável por lidar com os eventos que afetam a execução das obrigações principais do contrato de PPP e concessão (prestação do serviço e pagamento por ele).
Creio que é importante o contrato ser claro sobre como são alocados os principais riscos que afetam a prestação dos serviços que são objeto do contrato. Agora, acho que não é relevante se isso for feito em uma cláusula única sobre alocação de riscos, ou se isso for feito em diversas cláusulas temáticas do contrato.
Se, contudo a idéia de ter uma cláusula única sobre a alocação de riscos induzir à criação de uma “cultura riscológica” na Administração Pública, uma cultura de reflexão sobre riscos, ai eu creio que seria uma boa coisa ter sempre uma cláusula específica sobre alocação de riscos, sem perder de vista, no entanto, que o contrato como um todo, o contrato em si é por excelência um instrumento de alocação de riscos.
Quanto ao equilíbrio econômico-financeiro – e esse é um tema sobre o qual estou escrevendo um livro agora – creio que há um desafio gigantesco tanto para a nossa prática jurídica em torno das concessões e PPPs, quanto para a nossa doutrina do Direito Administrativo.
Do ponto da teoria do Direito Administrativo, é preciso incorporarmos à elaboração sobre equilíbrio econômico-financeiro a idéia que os contratos administrativos são instrumentos de alocação de riscos. Para incorporarmos isso temos que mudar a visão corrente de que a equação econômico financeira do contrato deve ser representada pela igualdade entre o preço pago pela Administração e o conjunto de custos mais margem do contratado. Porque se a essência do contrato é distribuir riscos, tanto as receitas quanto os custos do contratado envolvem riscos. Isso quer dizer que existem casos em que os custos do contratado serão maiores ou menores do que o que ele estimou na sua proposta inicial, e que nem por isso ele fará jus à recomposição do equilíbrio econômico-financeiro. Também há casos que as suas receitas são menores, ou maiores do que esperado, e nem por isso o contrato deve ser reequilibrado. Esse é o desafio da Teoria Jurídica do Direito Administrativo.
Em relação à prática da estruturação de contratos de concessão e PPP, creio que o maior desafio é se construir sistemas de recomposição do equilíbrio econômico-financeiro que sejam coerentes com a matriz de riscos contratual, que não a distorça. Isso parece algo trivial, mas não é. Só para dar um exemplo: na esteira da experiência americana, é comum no Brasil adotar-se a regulação por taxa de retorno, como instrumento para manutenção do equilíbrio econômico-financeiro. Ora, se se adota esse sistema de regulação, para que o sistema de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro não distorça a matriz de riscos contratual, seria necessário o regulador estabelecer limites em relação a cada um dos conjuntos de custos do contratado, de maneira que eventual ineficiência do concessionário na gestão dos custos não seja repassada para o usuário e para o Poder Público. Do contrário, a regulação de taxa de retorno vira simplesmente uma “garantia de taxa de retorno” que distorce a matriz de riscos e permite ao concessionário transferir para o Poder Público e para os usuários riscos (e custos) com os quais ele deveria lidar.
PPP Brasil. Quem é o ator mais “culpado” pelo fato de que, em regra, o tema dos riscos e do equilíbrio econômico-financeiro ser ainda tratado de modo superficial nos negócios público-privados no Brasil? O poder público ou a iniciativa privada? Os economistas, os engenheiros ou os advogados?
Mauricio P. Ribeiro: É difícil atribuir culpas por isso. Posso começar excluindo os engenheiros da discussão, porque esse é um tema sobretudo econômico e jurídico. Os aspectos de engenharia são secundários nessa discussão.
Em relação ao mundo jurídico, existe hoje um conflito de interesse fundamental em torno do tema equilíbrio econômico-financeiro. Boa parte do que termina publicado como artigo, livro etc. sobre o tema foi produzido em situações em que o autor estava contratado pela iniciativa privada para defender um pleito perante a Administração Pública. E isso influencia a posição tomada e exposta. Então, é preciso ter cuidado quando selecionamos as nossas leituras sobre esse tema, especialmente se queremos ter acesso a uma visão isenta...
Além disso, é muito comum os juristas tratarem o equilíbrio econômico-financeiro como uma questão de princípio, sem se dar conta das conseqüências no plano econômico e financeiro do que defendem, até mesmo porque não foram treinados para isso. Note, por exemplo, que nos livros de doutrina jurídica se fala em ter/não ter direito à recomposição do equilíbrio econômico-financeiro. Pouco se fala sobre o que significa exatamente de uma perspectiva econômico-financeira a recomposição do equilíbrio em si... e não dá para imaginar que a mera idéia de equação econômico-financeira resolve isso por si só...
Além disso, os juristas e alguns advogados no Brasil em regra ignoram os incentivos produzidos pelas decisões que aconselham seja adotadas nos casos jurídicos. E isso também é preocupante porque decisões em torno da matriz de riscos e do sistema de equilíbrio econômico-financeiro deveriam ser pensadas para produzir os incentivos corretos para a geração de eficiência econômica...
No mundo da economia, tem pouquíssima gente se dedicando seriamente ao tema do equilíbrio econômico-financeiro. Nesse particular, eu queria citar especialmente o trabalho do Jose Luis Guasch, Granting and Renegotiating Concessions – Doing it Right, que é um dos melhores nessa área de uma perspectiva econômica. Acho que vale a pena citar também os trabalhos do Professor Eduardo Engel, especialmente os artigos sobre a licitação pelo menor valor presente líquido de receita, que cria, na minha opinião, um paradigma diferenciado para tratar o tema do equilíbrio econômico-financeiro. Por fim, queria citar alguns trabalhos isolados produzidos por Michael Klein no final da década de 90 sobre a relicitação de ativos de infraestrutura para resubmeter a condições de mercado (leia-se reequilibrar) contratos de concessão e PPPs.
Do ponto de vista da prática econômica, acho que existem nas agências reguladoras técnicos capacitados para lidar com questões regulatórias complexas, mas falta muitas vezes a capacidade de transitar da teoria econômica para a teoria jurídica sobre regulação e sobre equilíbrio econômico-financeiro. Mas tem também reguladores mal preparados. Eu tenho visto com freqüência contratos bem elaborados serem descaracterizados por uma regulação deficiente.
PPP Brasil. Você teria como fazer uma análise crítica dos procedimentos de manifestação de interesse (PMI) dos quais tenha participado? Na sua opinião, o uso do PMI no Brasil pode ser classificado mais plenamente como “diálogo público-privado” ou “monólogo privado”?
Mauricio P. Ribeiro: Como chefe da área de consultoria em infraestrutura do IFC no Brasil, nos últimos 3 anos, não estive formalmente envolvido em nenhum processo de manifestação de interesse. Por isso, eu prefiro não fazer uma avaliação sobre esse tema.
PPP Brasil. Para finalizar, a pergunta que todos se fazem: o que deveria ser feito para que as PPPs fossem utilizadas com mais frequência e qualidade no Brasil? Você poderia indicar e hierarquizar os três aprimoramentos prioritários que deveriam ser buscados entre os atores do mercado de PPPs?
Mauricio P. Ribeiro: Eu acho que a primeira coisa a ser feita é acabar com as facciosidades ocultas contra as PPPs e concessões e a favor das obras públicas que existem no nosso sistema jurídico e na nossa prática administrativa. Eu já apontei algumas dessas facciosidades acima.
Em segundo lugar, para fazer concessões e PPPs bem feitas é preciso existir a combinação entre disposição política e preparo técnico. Disposição política é algo que não controlamos. Mas preparo técnico requer formação e experiência. Uma pessoa só está pronta para estruturar e avaliar adequadamente uma concessão ou PPP depois de ter acompanhado de dentro um projeto do princípio ao fim, e de ter se dedicado a aprender com isso. E isso demora pelo menos dois anos. Atualmente, está a disposição do Poder Público a EBP – Empresa Brasileira de Projetos e a parceria IFC/BNDES/BID na qual há pessoas capacitadas para estruturar projetos adequadamente para o Poder Público, especialmente para ajudar e ao mesmo tempo treinar agentes públicos ainda sem experiência no tema a conduzir projetos de PPP e concessões desde o momento da sua estruturação até a assinatura do contrato.
Por fim, é preciso fortalecer e proteger os nossos reguladores e fiscalizadores de contratos de concessão e PPPs, aqueles que vão acompanhar e fiscalizar os contratos. Isso significa aumentar a sua independência financeira, administrativa e técnica. Acabar com os cortes orçamentários sofridos pelas grandes agências, aperfeiçoar o sistema de indicação de diretores das agências, reduzindo o prazo de vacância das diretorias das agencias. Estimular a formação de quadros técnicos permanentes nas agencias e nos órgão fiscalizadores. Tudo isso são medidas que precisam ser adotadas e das quais muitas vezes os Governos descuraram nos últimos anos.